quinta-feira, 31 de julho de 2014

O EXERCÍCIO DA ARTE ENQUANTO PROCESSO DE ELEVAÇÃO E/OU SUPERAÇÃO HUMANA - NIETZSCHE


O exercício da Arte, embora não seja do conhecimento de muitos, coloca o homem em sintonia com a sua humanidade, com a sua condição de homem de fato, de ser racional. 

Pode-se ainda, sem exageros, dizer que é por meio do exercício da arte que o homem se humaniza e/ou caminha rumo à construção da sua humanidade.

Nietzsche, por exemplo - através da sua filosofia da superação humana -, coloca o valor da Arte, para o homem, exatamente nesse contexto, ou seja, no da condição para a elevação e/ou superação por meio do exercício dela.

Para ele, o que há de grande valor no homem é o fato dele (diferentemente de todos os outros animais, que são seres completos e/ou predeterminados por suas naturezas) ser uma ponte e não um fim. Isto é, o fato dele, do homem, ser uma passagem e não um acabamento e, portanto, por ser algo que precisa ser construído.

Todavia, na mesma medida, Nietzsche faz uma crítica severa à sociedade de sua época, pelo fato da mesma, segundo ele, ter feito com que os homens abandonassem e/ou abortassem às suas capacidades criativas e se tornassem, numa outra via paradoxal às suas racionalidades, escravos das coisas que eles mesmos criavam e criam, impedindo, assim, que todos os homens, no sentido macro e genérico do termo, evoluíssem, evoluam e/ou se superem enquanto indivíduos e espécie.

Escreveu-nos Nietzsche, no seu conhecido livro “Assim falou Zaratustra” sobre o Ser homem, dizendo:

“Percorrestes o caminho que medeia do verme ao homem, e ainda em vós resta muito de verme. Noutro tempo foste macaco e, hoje, o homem é mais macaco do que todos os macacos. (...) O homem é um ser superável. O que fizeste para superá-lo?” (Nietzsche, Friedrich. Assim falou Zaratustra. P. 25)

Ou seja, para Nietzsche “criar é ultrapassar-se e, sendo assim, a criatura deve sempre buscar prevalecer sobre o seu criador”.

Para ele, o homem deve amar o ato de conhecer e, nesse sentido, ele, esse mesmo homem, ao buscar conhecer, deve também desprezar o próprio eu que constrói, ou seja, o homem deve, buscando sempre a sua superação, ser capaz de criar um caos dentro de si por meio do exercício ou da prática da arte. Escreveu-nos também ele:

“Eu vos digo: é preciso ter um caos dentro de si para poder dar luz uma estrela cintilante... tenha um caos dentro de vós. O criador procura companheiros, não procura cadáveres, rebanhos... procura colaboradores que escrevam valores novos nas tábuas novas. (p. 28-33)

Para Nietzsche, como se percebe, a arte não é somente o que permite ao homem transformar a vida, mas também o que lhe permite poder, por meio dela, superar-se ao renová-la por intermédio do exercício pleno – que para ele é também vital – do seu processo criativo. Ou seja, o exercício e/ou a prática da arte, para ele:

1-   É o mesmo que a afirmação da vida;
2-   É o mesmo que afirmação das potencialidades humanas;
3-   É o mesmo que vontade de potência;
4- É o mesmo que a afirmação da vontade necessária de superação constante rumo ao que ele convencionou chamar de super-homem, o chamado super-homem Nietzschiano.

Para Nietzsche, fazer arte é potencializar a própria vida, ao acrescentar-lhe, por meio dela, novos valores e, nesse sentido, quebrar as velhas tábuas dos mesmos.

Enfim, a arte, antes, durante e depois de tudo, foi, é e será sempre um mecanismo de afirmação da vida e/ou, num outro viés, o não exercício dela, um fator de negação e/ou aceitação da morte.

Nas palavras de Ernest Fischer, complementando as apreciações de Nietzsche:


“(...) Enquanto a própria humanidade não morrer, a arte não morrerá.” (FISCHER, Ernest. A necessidade da arte. 6ª Ed. Rio de Janeiro. Zahar, p. 245-254)

sábado, 19 de julho de 2014

CRIAR É SE SUPERAR - NIETZSCHE - CLEBERSON EDUARDO DA COSTA


Não tenho aqui a pretensão de elucidar e nem tampouco de explicar Nietzsche, uma vez que, penso que, o mesmo, por tão complexo e hermético que é, não pode ser traduzido. Penso mais: que todo aquele que tem a pretensão de traduzir Nietzsche corre também o risco de traí-lo.

Meu objetivo aqui é apenas fomentar o diálogo e a problematização acerca de questões que, a meu ver, tem sido mal colocadas e/ou desvirtuadas por parte de alguns ditos filósofos pós-modernos a respeito dos principais axiomas de Nietzsche.

Nietzsche, embora não saibam muitos, critica a moral judaico-cristã e também os auspícios da ciência no que se refere à busca desta pela verdade. Todavia, sua crítica, em nenhum momento, o coloca na condição daquele que faz apologia às imoralidades, às libertinagens e/ou à criação de novos dogmas para serem postos como ditas verdades.

I - Sua obra o "Anticristo" não se trata de uma apologia ao ateísmo, mas de uma visão sobre o que fizeram de Deus e também de uma configuração sobre o niilismo provocado pelo Antropocentrismo ao Teocentrismo com o surgimento da era moderna. Nietzsche, por exemplo, diz-nos: "(...) Eu somente creria num Deus que soubesse dançar..." 

II - Vontade de potência, em Nietzsche, diz respeito à importância da busca do homem pela sua superação enquanto ser humano, ou seja, diz respeito ao alcance da plenitude de sua humanidade. E ele nos diz: "O homem é uma ponte e não um fim... O homem é uma ponte que vai do animal para além dele mesmo... e é perigosa essa travessia..." 

III - Ser "humano, demasiado humano", para Nietzsche, não é um Ser se tornar escravo dos seus próprios maus e/ou supostamente auto ditos bons instintos; não é se tornar escravo do seu próprio corpo, dos seus desejos, ainda que se julgando, nesse tortuoso caminho, estar seguindo em oposição férrea às ideias e/ou aos ditos ideais Platônicos. Ser “humano, demasiado humano”, para Nietzsche, frise-se: é apenas pôr-se a exercitar-se como artista, isto é, é buscar ser capaz de criar e recriar novas formas possíveis de existência. Para Nietzsche, voltar-se para a arte, para o “que fazer artístico”, para a criação de novos sentidos para a vida, já é questionar e/ou revolucionar todas as formas antigas ou modernas estabelecidas de ditas verdades.

IV - Nietzsche diz-nos mais: "se criar é ultrapassar-se, a criatura deve sempre buscar prevalecer sobre o seu criador." 

V - Para Nietzsche, todo aquele que cria valores novos, inevitavelmente destrói e/ou questiona aqueles que, anteriormente, tinham sidos criados. Entretanto, o super-homem defendido por Nietzsche não deve ser entendido como um corruptor, mas apenas como um legislador de novos sentidos e não como um suposto criador de novas ditas verdades.

VI - Nietzsche, em vários dos seus escritos, fala-nos, por exemplo, da necessidade da existência de três transformações no espírito e, sob as quais, deve ou deveria passar o Ser humano, a saber:
1- o camelo;
2- o leão;
3- a criança.

Numa espécie de metáfora por Nietzsche criada, o camelo, com um número excelso de cargas sobre as costas, está representado pelos homens de cultura judaico-cristã que, sob a forma de dogmas e/ou verdades ditas eternas e imutáveis, as carregam e propagam-nas enquanto valores absolutos.

O leão, para Nietzsche, está representado pelos homens da era moderna e/ou agora pós-moderna que, motivados pelas ideias antropocêntricas, ao mesmo tempo em que negam e esforçam-se para destruir as ditas verdades judaico-cristãs, colocam em seu lugar, também na condição de dogmas, os ditos valores e/ou saberes científicos.

A criança no espírito, para Nietzsche, é colocada "como um começar de novo; como uma roda rodando por si mesma; como um dizer não diante do que impede o homem de tomar sobre si a sua humanidade", que é entendida como o desenvolvimento, em si, das capacidades de questionar, de dialogar e de criar novos sentidos. 

Criar novos sentidos, para Nietzsche, como talvez possam pensar muitos, não diz respeito a "inventar ditas novas pessoais e/ou subjetivas verdades" e, na mesma via, se tornar escravo delas, como o fazem as pessoas que possuem Camelos e/ou Leões em seus espíritos.

VIII - Para aqueles que acham que Nietzsche pregou ou prega a imoralidade, a amoralidade, a promiscuidade, a poligamia e a libertinagem, enganam-se: ele, Nietzsche, num dos seus escritos, diz-nos:

"Se teus cães selvagens estão prontos, loucos para saírem de dentro de ti, querendo ladrar... é porque ainda não conheces de fato o que é o super-homem..."

Em seguida, ele complementa-nos dizendo:

"Não vos aconselho que mateis os sentidos, mas que haja inocências em vossos sentidos." 

É fato que muitos chamaram Nietzsche de louco. Para estes, Nietzsche, “humano, demasiado humano” que sempre procurou ser, apenas respondia-lhes:

"(...) O que dizem em mim ser  loucura, chamo-a 

apenas de saúde interior..."

terça-feira, 8 de julho de 2014

CATÁSTROFE NA ESCOLA: A NEGAÇÃO CONSENTIDOS DOS DIREITOS À HUMANIZAÇÃO & À EMANCIPAÇÃO INTELECTUAL

A obsolescência programada, baluarte da globalização e um dos principais fundamentos do mundo Neoliberal e Neo-pós-moderno capitalista, trouxeram para a sociedade planetária problemas que ela não soube e não sabe resolver.
Problemas estes relacionados não somente as questões humanas, sociais e econômicas, frente ao Individualismo e à Meritocracia (valores propagados pelo capital), mas também e, sobretudo, problemas ambientais; do mundo físico, consequentes da Mercantilização de todas as coisas, materiais e imateriais; consequentes da busca antiética pelo lucro certo, pelo lucro a qualquer preço.
Nesse cenário de catástrofes humanas, sociais e ambientais, surge e apresenta-se outra catástrofe: a catástrofe da escola.
Ou seja, numa era onde se impera a ética do Individualismo e da Meritocracia, como sendo, de fato, sinônimos da justificativa da exclusão, a escola se torna ideológica, na medida em que é especificamente concebida pelo Estado Mínimo Capitalista como o lugar onde os preceitos de humanização e emancipação intelectual são abortados, dinamitados; e, numa outra via, sistematizado o corolário capitalista como seu conteúdo ético-pedagógico.
A globalização Neoliberal, ao mesmo tempo, que trouxe à possibilidade de mostrar os diferentes e/ou as diferenças culturais planetárias, nos seus diferentes povos, por outro lado, associada às políticas capitalistas de expansão de mercados consumidores, paradoxalmente potencializou o desenvolvimento do individualismo, do consumismo, do hedonismo antivirtuoso, do narcisismo, do genocídio, do xenofobismo e dos nacionalismos, levando as sociedades do capital para longe da capacidade de coexistir, de tolerar, de respeitar as diferenças.
Nesse sentido, a desumanização imperou como conteúdo ético capitalista em escala global, planetária, sob a insígnia de repúblicas democráticas capitalistas, comparadas a democracia Ateniense, do mundo Grego, onde aproximadamente noventa por cento dos habitantes não eram considerados cidadãos plenos e, portanto, não participavam dos rumos e/ou das decisões da polis por questões nacionalistas, de autoctonia, anticosmopolitas, sendo estas justificadas pela premissa da busca da autopreservação enquanto sociedade.
À volta a esse tipo de nacionalismo xenofóbico, exacerbado e centrado em si, de “glória do eu mesmo” e de “desprestígio do outro”, por meio dessa Globalização Neoliberal Capitalista, entrou pelas veias dos diferentes povos, como uma espécie de chip da ignorância contra os diferentes e as diferenças; contra os estrangeiros, ou seja, contra os ditos estranhos; contra os ditos inimigos em potencial; contra os não “Eus” que, pela globalização, passaram a ter que enxergar, sistematizando a sociedade dos mesmos, transformando, pela coação, pela educação ou pela coerção, o outro no mesmo.
Princípios de sustentabilidade, biodiversidade, educação ambiental, tolerância e respeito às diferenças passaram então a ser perseguidos como ideais biófilos por uma pequena parcela social e, em outra, por parte dos capitalistas, tentando mascarar suas reais responsabilidades, jogando a solução desses problemas para a sociedade, sabendo que a mesma não tem condições de resolvê-los.
Redefinições no caráter da educação, no papel da escola e no que diz respeito à função social do professor, passaram a soar como um imperativo, na medida em que a condição humana desumanizada passou a ser percebida como um produto da sociedade do capital, demonstrando a impotência da escola no enfrentamento desse problema.
Ou seja, a escola, hoje, nas sociedades do capital, é catastrófica porque reflete e reproduz essa sociedade perversa, corrompendo, impedindo o indivíduo que nela entra de educar-se de fato, de humanizar-se, de emancipar-se intelectualmente, ou seja, de poder desenvolver-se, desenvolvendo em si uma condição humana verdadeiramente humanizada.
A escola, hoje, não passa de um sofisma grego: o ideal da estátua. O ideal de poder vir a ser o eu mesmo, o mesmo sempre; ou então de ser o outro, de poder ser o outro completamente.
Isto é, a escola prega a missão, hoje, no mundo do capital, de poder transformar gruas em cisnes, mascarando o caráter perverso do capitalismo, uma vez que ela, na verdade, simplesmente cria estigmas, cristaliza ilusões, sistematiza e justifica a exclusão ao, através dos diplomas e dos currículos, dizer, enganosamente quem é inteligente e quem não é; quem terá sucesso e quem não terá; quem será incluído e quem não será.
Em todas as suas línguas, como o estado capitalista, a escola mente. Exatamente aí está à catástrofe da escola, a Pedagogia da Mediocridade.
O que se sinaliza é que, sem que a Escola venha procurar conhecer a si mesma, difícil será vislumbrar novas possibilidades de transmutação.
Repensar e redefinir os valores sociais, as políticas educacionais, eis os grandes imperativos da educação para e Escola na era dos Estados capitalistas.
Todavia, como veremos as instituições educativas, como sendo ideologicamente reprodutoras e não transformadora da sociedade do capital; como sendo reprodutora dos valores Individualistas e Meritocráticos do capitalismo, como salientaram vários intelectuais como Paulo Freire, no seu livro Pedagogia do oprimido e Pablo Gentili, no seu livro Pedagogia da exclusão, fracassa nesse processo, ou seja, ao invés de educar, deseduca, ao invés de humanizar, desumaniza, ao invés de ensinar a pensar, adestra e treina o indivíduo para ter pensamentos.
Ou seja, a escola, não transforma a sociedade do capital, mas submete-se aos seus valores, reproduz e sistematiza-a com todas as suas mazelas sociais.

 

Tema:FilosofiaCiências Humanas e SociaisDesenvolvimento HumanoPalavras-chave:emancipaÇÃo, humanizaÇÃo, intelectual

Ps. texto introdutório, parte do livro "Catástrofe na Escola: a negação consentida de direitos, de Cleberson Eduardo da Costa, à venda, em todo o mundo, impressos e kindle, inglês e Português, via www.amazon.com 

MEDÍOCRES S.A: OS ESCRAVOS PÓS-NODERNOS

Epistemologicamente, tal problemática está situada entre duas distintas teorias do ser: 
1- A de Aristóteles, centrada nas concepções do Ato e da Potência, caracterizadas nas finalidades do ser, ou seja, do que o ser pode vir a ser a partir do que se é; 
2- E a concepção de Sartre, contrária a de Aristóteles, que preconiza que “o ser é o que é”, ou seja, que não é um ser fechado em si, em uma natureza, mas aberto para uma Condição Humana.
O novo sentido, a releitura, consiste exatamente num estudo mais aprofundado, especificamente no que diz respeito às concepções Aristotélicas de homem, em que se vislumbra, descobre-se, dois diferentes sentidos para o termo finalidade: 
A- O primeiro, como objetivo (alvo a ser alcançado); 
B- O segundo, como fim a que algo se destina (predeterminação).

O que se desvenda é que, todos os outros seres, na teoria do Ato e da Potência de Aristóteles, diferentemente do homem, estão concebidos como sendo seres irracionais, e, portanto, dentro de uma concepção de finalidade, pela natureza, determinista e/ou pré-determinista.

Todavia, quanto ao homem, há uma finalidade, mas não como predeterminação, e sim como alvo a ser atingido. Ou seja, existe algo em aberto, um “que fazer” humano, uma condição que precisa ser atingida para que o homem se torne homem de fato, muito além dele simplesmente nascer homem, crescer e morrer.

Aristóteles definia o homem como um ser racional por natureza (mas como alvo a ser alcançado e não no sentido de determinação) e considerava a atividade racional, o ato de pensar, como a essência dessa dita finalidade, isto é, como o poder viver de acordo com a sua razão.

Dizia ele que, para ser feliz, para realizar-se enquanto homem, essa razão deveria comandar os atos da sua conduta ética, orientando-o na prática da virtude.

Teóricos que se centraram especificamente nas concepções do Ato e da Potência, sem entender que havia uma exceção a essa regra especificamente relativa ao homem, ao “ser homem”, dado que Aristóteles tinha uma teoria paralela, específica para o ser homem, não entenderam Aristóteles como deveria e, como Sartre, ainda que com toda a sua grandeza e magnitude filosófica, julgaram-no mal.

Aristóteles, ao falar da conduta ética, da prática da virtude, da busca da felicidade, fala da necessidade da existência de uma condição humana humanizada no homem, em coerência com a sua racionalidade, para que ele de fato se humanize, mas não de qualquer condição dita humana, e sim de uma que permita a ele se humanizar, tornar-se ser humano de fato.

Buscando respaldo em Nietzsche, nas suas apreciações de que “o homem é uma ponte que vai do animal a além dele mesmo”, assim como nos fundamentos epistemológicos existencialistas, e, confrontando dialeticamente esses saberes com as problemáticas históricas de exclusão social e econômica, especialmente no presente século, chegamos ao axioma de que:

"...Homens distantes de uma condição humana humanizada de fato, distantes do exercício da sua racionalidade, além de não se realizarem enquanto seres humanos de fato; além de não se tornarem homens de fato, adquirem, incorporam, em si qualquer outra condição existencial paradoxal a uma condição humana humanizada de fato, tornando-se escravos, animalizados, alienados e, no sentido moderno, excluídos..."

Ou seja, justamente aí está caracteriza a abertura “do ser homem: ele pode alcançar o seu alvo, realizar-se de fato enquanto homem, tanto quanto pode ser qualquer outra coisa; tanto quanto pode ter em si qualquer outra condição inautêntica, desumanizada, animalizada, quando distante da sua finalidade, diferentemente de todos os outros seres.

Chamamos, assim, esse não realizar-se do homem enquanto homem, essa condição humana não humanizada do homem, especialmente nas sociedades capitalistas ocidentais, onde tanto as relações sociais cotidianas, tanto quanto as diferentes instâncias pedagógicas estão impregnadas ideologicamente de valores individualistas, Meritocráticos, consumistas e xenófobos, de Mediocridade.
PS. TEXTO INTRODUTÓRIO E PARTE INTEGRANTE DO LIVRO "MEDÍOCRES S.A: OS ESCRAVOS PÓS-MODERNOS,  280 PAGINAS, DE "CLEBERSON EDUARDO DA COSTA, À VENDA, EM TODO O MUNDO, VIA WWW.AMAZON.COM (FORMATOS KINDLE E IMPRESSOS).

HUMANIZAÇÃO & EMANCIPAÇÃO INTELECTUAL


I
Humanizar-se, muito além do que poder se desenvolver por meio dos processos de socialização primária (na família) e secundária (na escola), é também um ato de Emancipação Intelectual, que se dá a partir e durante a tomada de consciência crítica. Todavia, nem todo aquele que busca a tomada de consciência crítica emancipa-se de fato, por dois motivos:
1- A emancipação intelectual é um processo de transformação e transcendência do espírito conhecedor;
2- De conquista da autonomia para ser, fazer e refazer-se dentro dos preceitos de humanização;
3-  A consciência crítica, sozinha, não passa de consciência “de”: pode-se ter consciência de uma coisa e não de outra.
Chega-se em dois axiomas:
1- Para humanizar-se, de fato, o homem precisa de educação, mas não de qualquer educação;
2- Ele precisa de uma educação que possibilite a ele, através do exercício da sua consciência reflexiva, desenvolver:
a) A consciência crítica de si;
b) A consciência crítica de mundo;
Nesse sentido, tratar-se-á, aqui, não das especificidades da tomada de consciência, mas de algo muito maior, concebidos como os amálgamas do ato de humanizar-se, ainda que teoricamente especificados, objetivando favorecer um melhor entendimento e que se sustentam e se corporificam na emancipação intelectual.
II
Longe do humanismo radical dos sofistas e do humanismo Antropocêntrico, sustentado pelas ciências, no qual o homem é colocado e ao mesmo tempo entendido como “a medida de todas as coisas”; e muito mais longe ainda das ortodoxias deterministas, sejam elas científicas ou de qualquer outra natureza, pode-se dizer que:
1-   O homem, por ser um ser social, um animal político, como descrito por Aristóteles, para estar no mundo, ele precisa de crítica e autocrítica;
2-   Querendo ou não negar a existência de Deus, o homem precisa entender que ele não é só natureza, mas também dotado de espírito, de razão, de pulsão e afeto, sintetizados numa condição humana;
3-   O homem precisa saber que ele é constituído de uma unidade de contrários, ou seja, de razão pulsão e afeto;
4-   Ele precisa saber também que, na busca pelo entendimento do todo, especificando e particularizando linhas de estudo e/ou pesquisas, o homem ficou preso em diferentes simbolismos, em diferentes formas ortodoxas de ver o mundo, cristalizando e sistematizando paradigmas, que os impede de ver a realidade em si, mas apenas para si;
5-   O homem precisa saber que, na busca pela felicidade, na busca pela sua realização pessoal, ele pode adoecer, pode ter perdas sócio afetivas, pode morrer, interrompendo sua trajetória de vida. Ele precisa entender que, ao nascer, começa a morrer. Ou seja, entender que a sua existência se constitui numa espécie de marcha para a morte;
6-   Na busca pela inserção social, ele precisa se dar conta do fato de que há na sociedade desigualdade entre os homens;
7-   Na busca pelo emprego, ele precisa saber que está inserido num mundo capitalista e, por isso mesmo, também Meritocrático, competitivo e individualista.
III
Ainda que, à primeira vista, possa soar como um paradoxo, a tomada de consciência de si, a consciência do ser sobre o seu “que fazer humano” não se dá somente na escola, nem somente na família e, muito menos ainda, somente nas redes sociais da internet ou somente nos outros meios de socialização específicos, relativos ao exercício dos diferentes papéis sociais, por dois motivos:
1- Na família, há certa camada de proteção, até determinada idade, assim como a construção de hierarquias e estigmas entre os indivíduos, que os impedem de se depararem frente a frente, diretamente, com as relações desiguais da vida social e de construírem uma imagem, uma consciência real de si.
2- Na escola, por outro lado, há a disseminação e a internalização, no indivíduo, de um saber erudito que o aliena, na medida em que o ilude, dizendo que somente a apropriação desse tipo de saber é capaz de conduzi-lo a melhores condições de subsistência. Além disso, valoriza-se a aquisição de conteúdos e não o desenvolvimento da criatividade; valoriza-se o aprender pensamentos e não o aprender a aprender ou o aprender a pensar.
3- Na internet, como já dito nos capítulos anteriores, não há relações de confiança nem de validade do saber, assim como incertezas sobre a sua qualidade.
4- No exercício dos papéis sociais está à prisão do ser, os estereótipos e os estigmas, que impedem o ser de ser algo além dele, no seu tempo e espaço.
Nos grupos favorecidos a tomada de consciência de si demora mais para acontecer, uma vez que a proteção familiar dura mais tempo, assim como os anos de escolarização.
Nos grupos menos favorecidos, a proteção familiar termina cedo, como também, muitas vezes, a escolar. Jogado precocemente na sociedade do capital, descobre-se, querendo ou não, uma realidade catastrófica, implícita nas circunstâncias da vida cotidiana. Essas relações sociais impingem-lhe a necessidade de constantes tomadas de decisão.
Nesses grupos menos favorecidos, desenvolve-se, cedo, a partir da vivência, um potencial emancipador, mas que logo se atrofia, na medida em que, ao se questionar a própria existência diante das problemáticas sociais, não se tem como compreendê-la de forma enriquecedora e qualitativa, por falta de uma sólida formação cultural. Ou seja, a consciência não se amplia e se cristaliza, especifica-se e limita-se como inconsciência do todo ou como consciência “de”.
Quando, porém, por algum motivo, mesmo sendo lançado cedo no mundo pela família, esse ser ainda assim consegue continuar na escola, dando sequência aos seus estudos posteriores, ele aí tem a possibilidade de confrontar os saberes da vida com os saberes eruditos e construir a sua própria visão de si.Ele passa a poder analisar, comparar, questionar, sintetizar, duvidar, começar a pensar, dando um sentido para sua existência. Ele começa a ter a possibilidade de construir estratégias de luta e resistência contra a sua condição de excluído social...


CURSO LIVRE DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO

segunda-feira, 7 de julho de 2014

PÓS-NEOLIBERALISMO: FIM DO CAPITALISMO (?)

Karl Marx acreditava que o capitalismo não subsistiria enquanto classe sociopolítica por trazer, em si, como uma espécie de paradoxo essencial; como uma espécie de contradição interna; como uma espécie de unidade de contrários, a capacidade de, ao mesmo tempo, se desenvolver e desagregar membros sob a forma da produção da exclusão social; sob a forma da concentração de riquezas, cada vez mais, nas mãos de poucos e, portanto, enquanto “sociedade política”, nesse sentido, naturalmente seria incorporada pela “sociedade civil”, ou seja, desapareceria. 

Marx, dentro dessa perspectiva, não somente previu o fim do capitalismo, mas também idealizou o surgimento natural das sociedades socialistas, que, em contrapartida, a corrente não socialista afirma ser completamente utópica, ou seja, um ideal nunca, de fato, capaz de ser atingido na prática. 

Com base nos preceitos de Marx, as sociedades do século XX viram surgir, em diferentes continentes, como tentativas de se construir uma alternativa social frente ao capitalismo, diferentes formas de sociedades ditas comunistas e/ou socialistas, como a das chamadas repúblicas socialistas soviéticas (já decaídas no final do século XX), a da China, a de Cuba e também muitas outras. 

Muitas dessas sociedades, todavia, receberam e, ainda hoje, recebem críticas substancias em relação não somente às suas reais viabilidades enquanto sociedades Socialistas, mas, também, quanto às suas fidedignidades aos ditos ideais de “sociedade perfeita” preconizados por Marx. 

Essas críticas não são somente feitas por parte dos representantes das alas Capitalistas, mas, também, ainda que em minoria inexpressiva, por parte dos que se dizem Marxistas, Neomarxistas e/ou Marxistas ortodoxos. 

A questão, nesse sentido, que por hora aqui se levanta, é: Se, como preconizou Marx, o capitalismo naturalmente desapareceria e daria lugar ao socialismo, não teriam essas ditas sociedades socialistas e/ou comunistas, erigidas no séc. XX, nas suas grandes maiorias, fracassado nesse ideal por terem sido justamente erigidas precocemente, antes do tempo, ou seja, terem sido erigidas antes das etapas previstas por Karl Marx para o suposto fim do capitalismo? E mais: estaria Marx certo quanto a essa questão sobre o fim do capitalismo? 

Pensa-se que, ao caminharmos em direção a resolução da segunda questão, a mais essencial, consequentemente estaremos também construindo meios plausíveis para a “problematização” da primeira, ainda que esse não seja, aqui, propriamente o nosso real e maior objetivo. Ainda assim, vamos a ela... 

Gramsci, com toda a sua magnitude intelectual, nos faz ver o problema sobre o dito suposto “fim do capitalismo”, preconizado de forma brilhante e epistemologicamente fundamentado por Karl Marx, através de outro ângulo; por outra via; por outro sentido. 

Gramsci simplesmente inverte o “conceito de Sociedade civil” preconizado por Marx e, justamente ao inverter essa compreensão sobre o conceito de “sociedade civil”, diferentemente de Karl Marx, fala-nos sobre o poder que a “sociedade política” tem, mesmo sendo quantitativamente inferior em relação à “sociedade civil”, de, através do controle e domínio da superestrutura (valores, cultura, etc.), transformar e solidificar os seus valores essenciais em conteúdos éticos de Estado, ou seja, torná-los e/ou transformá-los numa espécie de corolário de toda a sociedade. 

Nas sociedades do século XXI, principalmente no Brasil e na América Latina, tem ganhado força as teorias Pós-neoliberais um tanto quanto românticas, ou seja, que, entre outras coisas, preconizam que, após as sucessivas crises do capitalismo, em especial àquelas ocorridas na Europa no início do século XXI, as sociedades estão caminhando finalmente rumo à sistematização da equidade social, em escala planetária, pautadas na ideia também de que o fim do capitalismo está próximo, ou seja, reavivando os grandes ideais Marxistas de sociedade. 

Em países como o Brasil, por exemplo, como também em outros da América Latina, as seguida eleições e reeleições, alcançadas democraticamente, através do voto popular, por presidentes progressistas, ditos de esquerda e, consequentemente, o avanço de políticas publicas significativas nessa direção, como a questão das cotas, por exemplo, ou seja, reservas legais de vagas, em universidades públicas, para etnias historicamente excluídas e para as de pessoas oriundas de diferentes grupos sociais excluídos, já é uma realidade jurídica nessas sociedades. 

Todavia, essa não é a única vertente sobre o sentido do Pós-neoliberalismo. Existe também aquela que, embora muitos a queiram chamar de pessimista, ela é, na verdade, realista, ou seja, não tão romântica e erigi-se justamente com base nos preceitos de Gramsci, apontadas também por Norberto Bobbio, no seu livro “o conceito de sociedade civil” (1995). 

Nesse sentido, com base nos conceitos de “inversão do conceito de sociedade civil” em Gramsci, pode-se dizer, ao contrário da versão romântica sobre o Pós-neoliberalismo, já descritas acima, que, ele, o Pós-neoliberalismo, entre outras coisas, na realidade, ainda que muitos não consigam e/ou mesmo não queiram ver, está sintetizado no axioma de que: “Os valores do capitalismo estão sistematizados nas sociedades ocidentais pós-modernas, instituídos estes como os seus conteúdos éticos de Estado, de tal modo que os ditos cidadãos, dessas mesmas sociedades, têm internalizado esses mesmos valores em suas psiques, como se os mesmos fossem de fato seus”. 

Isto é, em outras palavras, estando os indivíduos dessas sociedades, com esses valores do capital conformados, mas agindo como se deles estivessem, de fato, livres: agindo, inconscientemente, em prol deles, conformadamente , crendo-se estarem, todavia, hiper-conscientes. 

Nesse sentido, o Pós-neoliberalismo se traduz, também, como uma inversão de valores. Por exemplo: 

1- O cidadão se transforma em consumidor; 
2- O sucesso pessoal vira sinônimo de competência, inteligência e qualidade extrema; 
3- A exclusão social se transforma em sinônimo de incompetência; 
4- A Inclusão social, por outro lado, se torna sinônima do aumento do poder de consumo que, por sua vez, se confunde com o sentido de prosperidade ou riqueza. 

Nas questões políticas, o Pós-neoliberalismo segue o mesmo caráter trágico dessa inversão de valores: 

1- Políticas públicas se transformam em sinônimo de caridade; 2- O Estado, ao invés de criar políticas públicas, cria estruturas para o desenvolvimento do capital e das políticas de consumo; 3- Os ditos três poderes viram sinônimos de fantoches dos valores do mercado, ao aprovarem e fazerem cumprir leis que mantenham e sistematizem esse “status quo”; 
4- As sociedades capitalistas se unificam em escala global, unificando mercados, castrando qualquer princípio de respeito à diversidade, “Planetarizando” e/ou Globalizando os processos de exclusão. 

Nesse sentido, diante dessa catástrofe social e humana, alternativas sociais, em tempos de exclusão e desencanto, urgem. Todavia, uma possível renovação social pela renovação do entendimento, soa-nos como mais um daqueles ideais que, quase todos, dizem-nos ser completamente utópicos e inviáveis na prática. 

Isso pelo fato de que, a Escola, de onde deveria nascer essa renovação do entendimento, está impregnada, como todas as outras instituições ideológicas do Estado, pelos valores do capital, especialmente por àqueles Individualistas e Meritocráticos, sob as bases do Neotecnicismo.