I
É
fato que não somente os homens ditos tradicionais, mas também a sociedade
patriarcal como um todo, incluindo-se aí muitas mulheres de cultura
judaico-cristã, têm demonstrado certo desconforto, ojeriza, náusea e, na mesma
via, criado resistências aos novos valores defendidos, vividos e compartilhados
pelas mulheres ditas pós-modernas ou feministas.
Alguns
e algumas, por exemplo, as tem chamado de loucas, psicóticas, neuróticas,
pervertidas e ateias; outros de vadias,
libertinas, promíscuas, poligâmicas, etc.
A
pergunta é:
As mulheres ditas
pós-modernas e/ou feministas têm buscado romper com os valores da chamada
sociedade patriarcal porque são libertinas, estão ficando loucas ou sendo
possuídas por ideologias diabólicas e ateístas como muitos indivíduos de
cultura judaico-cristã ou tradicional têm ainda hoje dito e/ou pregado?
II
A
temática, como se pode perceber, é complexa. Todavia, pode-se com propriedade
afirmar que o novo modo de vida (e valores) das mulheres ditas pós-modernas ou
feministas não se trata (nem de longe) de um problema psicopatológico, e muito
menos espiritual, etc., mas sim de natureza ético-comportamental, porque
substanciado na busca por uma mudança de paradigma sociopolítico. Ou seja,
substanciado na busca por uma maneira mais livre, igualitária ou considerada
mais justa de existir, já que o homo sapiens, segundo pensam as mesmas,
diferentemente de todos os outros seres, não está preso, como também preconizaram
Hannah Arendt, Sartre e tantos outros pensadores contemporâneos, em uma
natureza ou forma pré-determinista de ser ou viver, mas sim em uma condição
humana.
Em
outras palavras, hoje, alvorecer do séc. XXI, tempo dito global, de novos
paradigmas, de obsolescência programada, de constante reflexibilização da
economia, e consequentemente de rupturas com a cultura catequizadora ou dita
civilizadora ocidental, etc., é preciso reconhecer que tem coexistido e que
ainda por muito tempo continuará a coexistir, na maioria das vezes de forma
conflituosa, dois diferentes tipos de mulheres: as ditas tradicionais; e as
ditas pós-modernas ou feministas.
III
Quais
são, pergunta-se, além daquelas que já tem circundado no senso comum, as
principais diferenças existentes entre elas? Pode-se dizer que são muitas. Mas que, resumidamente:
1-
A mulher tradicional, como muitos sabem, é
aquela, criada à imagem e semelhança da mãe, que, além de quase assexuada e sem
desejo próprio, é vista e/ou coloca-se como santa, imaculada. Isto é, como
aquela que, ao “padecer no paraíso”, não goza à vida (em todos os sentidos)
porque sobrevive para realizar os prazeres ou desejos dos outros, incluindo-se
aí os do dito marido e dos filhos, etc., uma vez que o seu destino era /ou é
visto como sendo o de casar e procriar.
2-
A mulher pós-moderna, ao contrário da
tradicional, é a dita anti “status quo”, é a dita “anti santa”, é a mulher que,
entre outras coisas, contrariando em muitos aspectos os valores da sociedade
patriarcal, busca também viver e sentir prazer. Ela pode até ser mãe e dona de
casa se quiser, mas isso está longe de ser uma obrigação ou imposição cultural.
Ela é aquela que assume-se como dona do seu corpo e do seu tempo. Ela é aquela
que faz ginástica para melhorar a saúde e se sentir mais bonita. Ela é aquela
que está disposta também a fazer plástica se julgar necessário. Ela é aquela
que busca ocupar, além do lar, outros espaços, principalmente os ditos
profissionais, por meio da dedicação aos estudos, etc. Ela é aquela que, sob a
filosofia do amor livre, a fim de não engravidar e/ou controlar a gravidez, faz
uso da pílula anticoncepcional, da masturbação e de muitas outras práticas
ditas não convencionais. Todavia, por mais paradoxal que possa parecer, ela é
também aquela que ainda busca e/ou sonha encontrar a sua alma gêmea. No campo
das conquistas, por exemplo, ela não espera mais ser escolhida: ela é capaz de
tomar a iniciativa em relação à busca do par afetivo e/ou sexual desejado.
IV
O
livro, um amálgama de crônicas, contos, poemas e ensaios, epistemologicamente
fundamentado, aborda a temática da mulher dita pós-moderna ou feminista, mas sob
a égide de diversos olhares. Ou seja:
1-
Questiona os valores da sociedade
patriarcal, assim como também às ideias tradicionais de loucura contidas nas
obras de Freud e Lacan que muitas vezes têm sido utilizadas para classificá-las,
confrontando as mesmas com a psicanálise existencial ou teoria filosófica
existencial-humanista. E, ao mesmo tempo:
2-
Defende (de forma epistemologicamente
fundamentada) a ideia de que, por estarmos, enquanto espécie, imersos numa
condição humana (muito além da ideia de natureza humana), é preciso que se
respeite e dialogue com novas formas de existência que diminuam e/ou buscam dinamitar
injustiças, violências ou desigualdades (especialmente em relação às mulheres).
V
Espera-se
que essa obra possa ser útil à formação de uma geração de homens e mulheres mais
iguais, mais livres e felizes, porque também mais conscientes da necessidade de
cultivarem o respeito e a tolerância em relação às suas diferentes formas de ser
e/ou existir.
O
autor